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sábado, 10 de abril de 2010

UMA CRÔNICA...



O sítio

Depois de três horas de ônibus estava de volta ao velho sitio da minha avó. As coisas mudaram muito, mas ela continua a mesma: forte e sábia, mais sábia do que nunca. Não me pegou no colo, é verdade, mas também não tenho mais três anos.

Três décadas se passaram, ela está mais grisalha. É o tempo, pondo umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens (já disse o poeta). Ela esta só, irremediavelmente só. O companheiro de tantos anos e tantas lutas ficou no caminho. Sempre os invejei, sempre procurei nos meus romances essa eternidade do enquanto dure. Meus avós conseguiram. Nos momentos mais difíceis, se fortaleceram, nas crises se uniram mais, nas maiores dificuldades sempre prevaleceu o respeito e o compromisso, quando faltou grana sobrou compreensão. Mas agora é só ela.

O sitio continua lindo. Nestes campos, não passou a reforma agrária. Talvez nem precisasse. Aqui a agricultura é familiar. A plantação é orgânica. Transgênicos e agrotóxicos são temas distantes deste cotidiano. As folhas e as frutas continuam caindo das arvores na época certa.

Cada palmo deste chão, cada árvore, cada canto deste espaço, são meus na minha imaginação. Vão comigo nos sonhos. Perambulam pelo mundo sem sair daqui. Estão sempre prontos para me receberem, independente do tempo que levou, da saudade que se acumulou.

De manhã o orvalho espalha a umidade no ar, que nos faz sentir mais acordados, mais despertos, mais vivos. E os primeiros raios de sol, nos convidam para o café que vai dar forças para o dia todo. Então quando vem a chuva, o cheiro da terra molhada me alegra e me faz querer jogar bola no campinho das traves de madeira. Estou novamente na minha velha infância.

Nessa infância construída com os pés no chão, fica fácil descobrirmos quem somos, o que queremos, aonde vamos. Somos filhos da Terra, irmanados no compromisso de sobrevivermos ou sucumbirmos juntos.

E a noite, quando o mundo parece mais longe e o grilo canta mais perto, um certo aperto no coração me faz lembrar da Cidade Grande. Das misérias que o homem faz com o próprio homem. Dos filhotes dos homens que dormirão nas calçadas. Dos pais de família que não dormirão até que um novo sol os chamem para luta.

O sítio é bastião contra as humanas dores do cotidiano. É fortaleza indevassável, esperança que o futuro e o progresso possam vicejar. Redenção das agruras da Cidade Grande.

Um dia talvez volte para ficar।
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AUTOR: Charles Alessandro Santos Martins
- Este texto está disponível na intranet do Banco do Brasil > Acesse Sua Área > Cadernos > Palavras Cruzadas, publicado pela VITEC-Brasília em 15.03.2010 e acessível a mais de 100.000 funcionários.
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COMENTÁRIO - Paulo Cesar Paschoalini:
O Charles é um cronista residente em Curitiba-PR, funcionário do BB e colaborador do caderno "Palavras Cruzadas". Gostaria de deixar registrado meu agradecimento por autorizar a publicação desse texto com qualidade e conteúdo poético execepcionais. Descrição maravilhosa e carregada de sentimento.
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